Bahia tem 39 cidades em alto risco para Chikungunya; saiba quais e como se prevenir

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Aedes aegypti, vetor transmissor de dengue, zika e chikungunya Crédito: Freepik

A Bahia tem 39 municípios classificados como de alto risco para a Chikungunya. A doença, que é transmitida por mosquitos do gênero Aedes infectados pelo vírus CHIKV, foi registrada em 387 das 417 cidades baianas entre 2014 e 2023. As informações são de um estudo inédito desenvolvido pela Universidade de São Paulo (USP) e pela Universidade de Guarulhos (UNG), que foi publicado na revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical.

O estudo monitorou, entre setembro de 2014 e dezembro de 2023, os casos confirmados da doença registrados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), banco de dados da Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab). A partir dessas informações, foi calculada a taxa de incidência em cada município, assim como analisadas e integradas informações adicionais, como temperaturas e níveis de precipitação, cobertura vegetal e saneamento básico.

De acordo com Maurício Lamano Ferreira, professor do Departamento de Ciências Básicas e Ambientais da USP, orientador e um dos porta-vozes do estudo, a lista com os municípios com maior risco de disseminação da Chikungunya foi construída, inicialmente, a partir da identificação de áreas onde houve concentração anormal de casos ao longo do tempo, usando análises espaciais e espaço-temporais.

“Nós priorizamos os municípios que fizeram parte de agrupamentos com risco significativamente maior que o esperado, especialmente aqueles que se repetiram entre 2014 e 2023 ou apresentaram tendência de crescimento da doença, mesmo quando o cenário geral do estado indicava queda. Também teve peso importante a sazonalidade, com maior risco nos meses de verão, principalmente em fevereiro e março”, explica Lamano.

Além da observação e identificação de tendências e características consistentes na ocorrência da doença, o estudo comandado pela pesquisadora Maryly Weyll Sant’Anna também notou que os municípios de maior risco compartilhavam condições climáticas favoráveis ao mosquito, como temperaturas mínimas mais altas, menor variação térmica ao longo do ano e maiores volumes de chuva, especialmente no verão.

“Esse conjunto de fatores criaram um ambiente ideal para a reprodução e sobrevivência do Aedes, aumentando a chance de transmissão do vírus. Do ponto de vista ambiental, essas áreas estavam mais urbanizadas, com paisagens fragmentadas e menor cobertura de biomas como a Caatinga, o que favorece a presença de criadouros artificiais”, aponta o professor.

Na publicação, outro ponto que chamou atenção foi a prevalência da doença em cidades com melhor estrutura socioeconômica. Segundo Maurício Lamano, apesar de parecer contraditório, há maior recorrência de casos de Chikungunya em locais mais urbanizados, densamente povoados e com intensa mobilidade de pessoas, uma vez que esses municípios funcionam como polos regionais de serviços, comércio e transporte, o que facilita a introdução do vírus e acelera sua disseminação.

“Assim, mesmo com melhores condições médias de infraestrutura, a circulação intensa de pessoas aumenta significativamente o risco de transmissão. Além disso, o estudo mostra que melhor saneamento não elimina os criadouros do Aedes. Em áreas urbanas mais desenvolvidas, predominam criadouros artificiais, como caixas d’água, recipientes, ralos, resíduos mal descartados e quintais urbanizados, que são justamente os preferidos pelo mosquito”, detalha o professor da USP.

Riscos

Quem é infectado pelo vírus da Chikungunya sabe na pele as adversidades de viver com as sequelas da doença. Essa é a situação da enfermeira aposentada Maria Rosely Rocha, 73 anos, que, no outono de 2020, foi ao médico com um quadro de dor de cabeça, febre e dores nas articulações que a levaram ao diagnóstico da doença.

Após 20 dias, teve piora acentuada no estado de saúde, com registro de bursite e tendinite nos ombros, além de edema nas mãos e articulações. Naquele período, ela ficou acamada e se viu vulnerável, sem conseguir realizar atividades comuns sem ajuda. Mesmo depois do tratamento com medicamentos e até outro diagnóstico preocupante – o positivo para a Covid-19 na pandemia –, Maria Rosely diz que nunca viveu nada parecido com a Chikungunya.

“Foi pior do que a Covid-19. Justamente por estar na pandemia, tive dificuldade para consultas, tratamento e cuidados. Além das fortes dores, incapacidade física, queimor e placas vermelhas nas pernas, o resultado do tratamento é muito lento. Após cinco anos, ainda sinto o efeito da doença com dores nas articulações, principalmente nos joelhos e edema nas mãos”, relata.

A infectologista Clarissa Cerqueira alerta que as sequelas incapacitantes, como as de Maria Rosely, são o principal risco das doenças, principalmente entre pacientes idosos. “A Chikungunya é uma doença muito mórbida. Ela não é como a dengue, que leva a uma letalidade ou vai matar o paciente de forma rápida. Ela, geralmente, deixa sequelas, como dores articulares muito intensas que podem persistir de meses a anos, o que é incapacitante”, pontua.

Alerta constante

É entre os meses de janeiro e junho que os casos de Chikungunya têm alta na Bahia, mas a prevenção começa antes. Em Itabuna, um dos municípios que integram a lista daqueles que possuem alto risco para a doença, a prefeitura deu início às atividades de tratamento de focos do Aedes aegypti desde o início de dezembro.

Além de uma campanha de conscientização através da distribuição de panfletos, a gestão municipal tem realizado um levantamento dos Índices de Infestação Vetorial do Aedes Aegypti, que tem servido de alerta para combater possíveis focos, conforme afirma a coordenadora de Combate às Endemias, Lucimar Ribeiro.

“O levantamento sinalizou que o momento é de intensificar os trabalhos de conscientização, porque o combate ao Aedes depende também da cooperação e participação da população. […] Estamos enfatizando a importância do manejo adequado”, ressaltou.

Para a infectologista Clarissa Cerqueira, todos os municípios classificados como de alto risco para a doença precisam investir em prevenção. Ela destaca, como ação a longo prazo, a preservação de coberturas vegetais. “O mosquito que transmite a Chikungunya, dengue e Zika é um mosquito urbano. Então, quando degradamos o ambiente, estamos tendo mais áreas urbanas, o que aumenta o risco da doença”, pontua.

Já como parte das ações imediatas, ela indica medidas que impeçam a reprodução do mosquito, como controle de água parada, limpeza de recipientes, uso de repelentes e uso de fumacês, que devem ser implementadas em todas as cidades, principalmente no verão e outono, estações que mais registram casos da doença por conta do calor e do alto volume de chuva.

Em abril, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária também aprovou a primeira vacina para Chikungunya, indicada para pessoas com mais de 18 anos que estejam em risco aumentado de exposição ao vírus. O imunizante de dose única produziu quase 100% de anticorpos neutralizantes durante os testes, o que faz dela uma vacina altamente eficaz, mas que, segundo Clarissa, não é imprescindível por ora. “Ela ainda não está sendo amplamente comercializada e nós temos outras formas de prevenção”, frisa.

Fonte: Jornal Correio

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