Museu de Arte da Bahia abre três novas exposições

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Forte Montserrat de Presciliano Silva, da exposição ‘Tradição e Invenção’ – Foto: Acervo Museu de Arte da Bahia

Hoje à noite, o Museu de Arte da Bahia (MAB) inaugura três exposições de longa duração que sinalizam uma inflexão decisiva na história da instituição centenária. Tradição e invenção, A Arte de Presciliano Silva e A Pintura de Manoel Lopes Rodrigues não apenas reorganizam o acervo do MAB, como explicitam um reposicionamento curatorial voltado à contemporaneidade, à ampliação de narrativas e à aproximação com públicos que, por décadas, não se reconheceram naquele espaço.

Fundado em 1918 como Museu do Estado, o MAB nasceu sob o modelo enciclopédico, reunindo coleções históricas, etnográficas e artísticas que, ao longo das décadas, formaram uma pinacoteca marcada pela herança colonial e pelo imaginário das elites baianas. Hoje, com um acervo de cerca de 20 mil peças, o museu revisita essa história a partir de novas chaves de leitura.

“O MAB é um espaço que foi formado de um acervo colonial aristocrático, que refletia as elites baianas do século 19, século 18, século 20. E acho que hoje cabe a gente fazer com que o povo baiano, de uma maneira geral, se enxergue nesse museu, que fala muito sobre Salvador, mas que se entende como museu de arte da Bahia”, afirma a historiadora e museóloga Camila Guerreiro, integrante da Comissão Curatorial do Acervo.

Contemplar vs. questionar

A revisão expográfica parte do reconhecimento de que a montagem anterior, concebida nos anos 1990 e início dos 2000, respondia à fruição estética e era pouco atenta às tensões sociais inscritas nas obras. A mudança acompanha transformações no campo museológico e nas expectativas do público, especialmente após as revoluções tecnológicas.

Nesse novo desenho, a curadoria abandona a lógica estritamente cronológica para apostar em diálogos, fricções e contrapontos. A ideia é “colocar as obras de muitos anos para conversar com esses artistas mais novos, para conversar com a cerâmica que é feita no interior, conversar com as nossas porcelanas coloniais, dos barões, das baronesas”, resume Camila.

A estratégia permite revelar histórias ocultas nos objetos e questionar narrativas cristalizadas. Esse processo exige pesquisa extensa, confronto de fontes e trabalho coletivo. Por isso, o novo projeto é assinado por uma comissão curatorial que reúne profissionais do museu e docentes da Ufba e da Uneb, mobilizando diferentes campos do conhecimento para dar conta das polifonias presentes nas coleções.

As exposições

Com mais de 150 obras da pinacoteca, além de oito peças emprestadas de outras instituições e artistas contemporâneos, como Tiago Sant’Ana e Mike San Chagas, Tradição e Invenção funciona como eixo conceitual da nova fase, ao revisitar a tradição das artes plásticas baianas do período barroco ao século XX, em diálogo com obras contemporâneas.

Esse contraponto permite tensionar o conceito de invenção, ampliando leituras sobre permanências, rupturas e transformações estéticas. Para o diretor do MAB, Pola Ribeiro, a proposta responde a uma obrigação institucional. “O que nós precisamos é apontar novos pontos de vista e apresentar essas mesmas obras com um outro olhar, com uma outra inquietação, porque todos os museus têm que estar na contemporaneidade”, afirma.

A ideia de diálogo entre tempos, segundo Pola, é constitutiva do próprio fazer museológico: “Acho que esse é o grande barato de a gente estar fazendo esse diálogo de tradição e contemporaneidade, tradição e invenção, que sempre foi uma questão. A gente vive e age baseado em tudo o que aconteceu, mas a gente sempre age com a intenção de o que vem a acontecer, do que vem a ser”.

As exposições dedicadas a Presciliano Silva e Manoel Lopes Rodrigues aprofundam esse movimento, ao apresentar conjuntos significativos de obras de dois artistas centrais da pintura baiana. Mais conhecidos pelos interiores de igrejas e pelas pinturas da República, respectivamente, ambos têm suas trajetórias ampliadas com a inclusão de desenhos, estudos e paisagens raramente exibidos.

Além das novas exposições de longa duração, o museu mantém em cartaz um conjunto diverso de mostras que reforça a amplitude de seu programa curatorial. O público pode visitar Carybé e o Povo da Bahia, dedicada ao olhar do artista sobre manifestações populares e identidades culturais do estado; Desperta Ferro; O Caminho de Volta, de Hilda Salomão, que também se desdobra no CURTAMAB, sala de audiovisual com curtas-metragens derivados da exposição; e Arte africana: Máscaras e Esculturas, que amplia o diálogo com matrizes culturais do continente africano.

Remover catracas invisíveis

A virada curatorial dialoga com um conjunto mais amplo de ações voltadas à ampliação do público. Pola identifica no cotidiano da cidade um paradoxo persistente: museus gratuitos que seguem sendo percebidos como espaços interditados. “Temos entrevistado essas pessoas e entendendo quais as dificuldades dessas pessoas de frequentar um museu que é gratuito. Então, assim, a gente tem estratégias”, diz.

Entre elas estão a ampliação do horário de funcionamento, a diversificação da programação e a ocupação dos espaços com atividades que extrapolam as exposições. Concertos da Escola de Música da Ufba, residências do Teatro Vila Velha, oficinas, feiras agroecológicas, lançamentos de livros, cinema, cerâmica e apresentações de dança e capoeira transformam o museu em lugar de permanência e convivência. Para Camila, o reposicionamento do MAB reafirma o papel social de um museu público. A proposta é que o público encontre no museu não apenas informação, mas também um espaço de reflexão, descanso e encontro.

Ao inaugurar essas exposições de longa duração, o MAB reafirma sua responsabilidade histórica e, ao mesmo tempo, ensaia novos modos de existir na cidade. Um museu que revisita seu passado para dialogar com o presente e, sobretudo, para permanecer aberto às múltiplas Bahias.

Abertura das exposições ‘Tradição e Invenção’, ‘A Arte de Presciliano Silva’ e ‘A Pintura de Manoel Lopes Rodrigues’ / Hoje, 18h / Museu de Arte da Bahia (Corredor da Vitória)

Fonte: A Tarde

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