Além de sofrer com a pandemia do novo coronavírus, que já matou mais de 50 mil pessoas, o Brasil tem enfrentado também um clima de turbulência e acirramento na política que, por um lado, prejudica o combate à Covid-19 e, por outro, coloca em xeque a nossa jovem democracia. Enquanto deveríamos estar focados em proteger as pessoas desse inimigo invisível, vivemos um período perigoso e de muita tensão, com ataques à política e às instituições democráticas que acabam atingindo, de relance, a democracia que estabelece a soberania do povo brasileiro.
Primeiro, quero destacar que encaro a política como um marco civilizatório. Até um certo momento, as sociedades simplesmente entravam em guerra com derramamento de sangue quando disputavam um determinado interesse. Vivíamos, portanto, uma plena barbárie. A política, a boa política, surge para enobrecer o trato social e as relações humanas, exaltando a capacidade de realizar algo que pode interferir no bem comum a partir do diálogo, do entendimento, do consenso.
A política é uma atividade muito nobre que tem sido massacrada, vilipendiada a partir do olhar sobre suas disfunções. Quando se fala em política, partindo do pressuposto da ‘politicagem’, da troca de favores, do apadrinhamento, se fala na verdade das suas disfunções e, assim, não contempla a sua essência, a sua importância para a nossa sociedade.
Justamente neste ponto, me preocupo com a escalada dessa expressão chamada “nova política” no atual momento do Brasil, especialmente neste combate à pandemia pelo novo Coronavírus. Muitas vezes, este ‘novo’ se coloca nada mais do que como um populismo travestido, com uma nova faceta que são as redes sociais. Mas uma ferramenta não muda a essência das coisas.
Vejo populismo em parte desse movimento, e isso é um traço negativo. Se a pessoa faz populismo com novas ferramentas, isso não é nova política, mas na verdade é a política mais arcaica que existe. Se os valores não são os melhores, mesmo que se esteja utilizando as novas tecnologias, então, estes valores continuam negativos.
E é com este pano de fundo que me preocupo seriamente com a fragilização da nossa democracia. Nós somos uma democracia jovem e vivemos num país que já sofreu muito, que tem desigualdades sociais tremendas e um povo muito suscetível a determinadas palavras de ordem e políticas sociais. Além disso, temos ainda uma cultura muito perversa, por assim dizer, pois aqueles que se apossam do poder público utilizam a máquina como se fosse um imperador de plantão. É uma personificação da política pública. Nós vivemos isso há pouco tempo no período do PT e observamos agora novamente em algumas iniciativas.
Além de tudo isso, me preocupa essa disputa política de maneira tão acirrada. Da mesma forma que eu não gostava daquele período do governo Lula em que havia uma tentativa de dividir a população brasileira, me causa certo temor, agora, esse clima de provocação e divisão que tem interferido, inclusive, nas famílias, nos grupos de amigos. Não faltam relatos de brigas e discussões mais enraivecidos entre pais e filhos, amigos, colegas de trabalho. As discussões acabaram se tornando muito rasteiras e passionais, como uma guerra de torcidas.
Estes elementos ameaçam a nossa estrutura democrática e, certamente, não são louváveis para a harmonia e civilidade do nosso convívio social ou sequer contribuem para o nosso desenvolvimento. Justamente por isso que sempre digo que, entre a política de esquerda e a de direita, eu fico contra a demagogia e o populismo, porque efetivamente esses dois quesitos são peças que corroem valores positivos da política e atingem em cheio a democracia.
Neste momento de combate à pandemia, a Bahia tem dado um exemplo para o Brasil a partir do trabalho conjunto entre o governador Rui Costa e o prefeito ACM Neto, que militam em campos antagônicos, mas deixaram de lado a disputa política, colocando como prioridade o bem público e, para além disso, o compromisso com a vida das pessoas.
Essa boa política é o que precisamos no Brasil. Ela é uma atividade nobre e essencial para uma vida em civilização, para que possamos evoluir enquanto cidadãos no sentido amplo, enquanto parte de uma sociedade em que todos estamos interligados. E mais do que isso: é um elemento fundamental para fortalecer a nossa democracia.
Muito diferente do que estamos vendo hoje no Brasil. Torcemos por um país mais oxigenado, com viés mais empreendedor, com a economia mais aberta e com recursos públicos voltados, de fato, para o cidadão, ao invés de ficarem dentro das castas. Para isso, precisamos ter muita serenidade com a coisa pública, o que não está havendo hoje. O caminho é longo, mas temos muito potencial e tudo em mãos para construir um caminho diferente. Eu acredito.
João Roma
Deputado Federal