Baixo entusiasmo e medo da pandemia podem aumentar abstenção na eleição, dizem especialistas

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Uma baixa no entusiasmo com as eleições, causada pela falta de campanhas de rua mais fervorosas, e o medo de ir votar em razão da pandemia de Covid-19 podem aumentar a abstenção no próximo pleito municipal, de acordo com cientistas políticos ouvidos pela reportagem.

Lorena Barberia, professora da USP, afirma que, em outros países onde houve eleições durante a pandemia, pessoas que são consideradas de grupos de risco, como os que têm mais de 60 anos, compareceram menos às urnas.

Existe também a preocupação de que eleitores que se sentem mais afetados pela pandemia se sintam ameaçados com uma possível mobilização de grupos que não respeitam protocolos para evitar contágio, como o uso de máscara e distanciamento social.

“Imagine um município pequeno, em que parte da população não acredita em usar máscaras, em distanciamento social, faz aglomeração, e eu, que estou no grupo de risco, gostaria de ir votar. Será que eu vou sair, arriscar a minha vida em frente a esse grupo que está mobilizado e me ameaçando?”, questiona a professora Lorena.

“Essa é uma questão que nos Estados Unidos está se discutindo muito. Usar máscara é uma questão ideológica, que tem sido correlacionada muito ao governo do presidente Donald Trump [também candidato à reeleição]”, completa.

Um possível aumento da abstenção nesta eleição não se relaciona apenas a um eventual medo do contágio no dia da votação.

Segundo o cientista político Antonio Lavareda, a pandemia alterou também a própria gramática das campanhas. Isso porque, para evitar a disseminação do vírus, as grandes passeatas e tradicionais caminhadas pelo comércio da cidade não têm mais a dimensão que costumavam ter.

“Isso afeta o entusiasmo dos eleitores, e o baixo entusiasmo pode vir a produzir uma elevação importante de abstenções”, diz Lavareda.

Um segundo reflexo da pandemia que caracteriza esta eleição como atípica, segundo o especialista, é elas aconteceram em um período de crise econômica, em que “setores produtivos foram impactados duramente no país durante a pandemia”.

Segundo pesquisa Datafolha realizada em 5 e 6 de outubro, 21% dos paulistanos consideram não ir votar por medo de se infectar com o coronavírus, mesmo índice da primeira pesquisa realizada em setembro.

Já em relação ao interesse do paulistano na eleição para a prefeitura foi registrado um aumento de 30% para 37% dos que indicam ter grande interesse —o instituto ouviu 1.092 maiores de 16 anos e a margem de erro é de três pontos para mais ou menos. Já o índice dos que não se interessam pela eleição continuou estável, de 33% para 29%.

“Se em 2016 a taxa de abstenção foi grande sem pandemia”, diz Érica Anitta Baptista, doutora em ciência política pela Universidade Federal de Minas Gerais, “possivelmente este ano terá um número mais expressivo de pessoas que já não se sentem motivadas a comparecer por vários motivos, como descrença no sistema político e nos políticos, e com o agravante da pandemia, que é um segundo motivo para reforçar a abstenção.”

“É interessante pensar nas eleições americanas porque, lá, o primeiro passo da campanha é incentivar o voto, que as pessoas compareçam. E estamos, de certa forma, vivendo isso aqui: além das estratégias de campanha, de mostrar as propostas, você tem um incentivo ao comparecimento, ao voto”, afirma Érica Baptista.

Lorena Barberia diz que em outros países onde as eleições aconteceram quando o controle da pandemia não era efetivo, como na França e na República Dominicana, a queda no comparecimento foi mais expressiva. “A questão em que temos que pensar é que somos um país grande, continental.”

“Pode ser que, em novembro, no momento de votação, alguns lugares estejam em uma diminuição de casos e não será tão arriscado para as pessoas comparecerem às urnas, mas pode haver outros estados em um período delicado, em que os casos estão aumentando. O TSE vai ter que pensar essa heterogeneidade em um país muito grande.”

As próximas eleições municipais terão um protocolo sanitário para evitar o contágio entre eleitores e mesários.

Entre as regras estão a obrigatoriedade do uso de máscaras, distanciamento mínimo de 1 metro entre as pessoas e disponibilização de álcool em gel antes e depois da votação. O horário também foi ampliado em uma hora para evitar aglomerações.

Lorena Barberia lembra, no entanto, que a única grande mudança das eleições no Brasil foi a alteração das datas do primeiro e segundo turnos, que passaram de outubro para novembro.

Em outros países, por exemplo, ampliou-se o voto por correio para diminuir a reunião de eleitores nos locais presenciais de votação. “Aqui ainda será uma eleição que vai acontecer em um dia, presencialmente, no país todo”, lembra a pesquisadora.

Uma das questões que podem agravar o cenário de abstenções, na avaliação de Barberia, é a falta de fiscalização de aglomerações ou de outras quebras de protocolos sanitários.

“Esse é um quadro complicado porque já temos visto isso como um assunto recorrente durante a pandemia, mesmo porque o presidente [Jair Bolsonaro] tem sido uma das pessoas que aglomera, não usa máscara”, diz. “É um exemplo de que a fiscalização, no geral, não tem funcionado.”

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